O que restou para nós?

[Tudo isso pode ser achismo, ou uma perspectiva em comum de visão do mundo. Depende.]

Miguel A Silva
5 min readJun 25, 2020

O texto surgiu desse diálogo:

O que sobrou para nós? — Perguntei a uma amiga, enquanto ela enfiava goela abaixo o último gole da cerveja.
— A repetição — ela respondeu.
— Eu quero uma história original — comentei.
— Você pode contar a história de alguém que não tem história — ela respondeu.
— Eu não quero contar a minha história — respondi com um riso sarcástico, de forma ríspida.
— Mas você também não pode sair por aí escrevendo as histórias que as pessoas com quem você trepou. Você tem que respeitar a história do outro, se você não tem história para contar, você pode criar uma. Ou recriar, já que não lhe sobrou nenhuma.

Nasci na metade quase exata do fim século vinte. Em março de 95. Pondero agora sobre o dia que acreditei que todas as histórias já tivessem acontecido. Fracassei, meses depois nessa hipótese, quando uma pandemia mudava o destino da minha geração. Antes, eu considerava certas questões a partir da seguinte pergunta:

“O que restou para nós? Tudo o que vejo daqui, são sobras.”

Refletia a partir dos dicionários, em como todas as coisas já tivessem sido nomeadas. Acreditei até que todas as guerras já tivessem sido travadas e que todos os absurdos tivessem sido pronunciados. E contados. Mas era um puro e doce engano. Ainda há guerras a serem travadas, com outros nomes, com denominações de batalhas, conquistas, talvez, mas não mais com os nomes que os livros de histórias dão: guerra&massacres porque isso pertence aos nosso antigos e não a nós, evoluídos seres humanos.

Photo by Rafaela Biazi on Unsplash

As palavras têm peso. Penso em elas, sobre uma balança de significados. A ressignificação de uma palavra pode causar a eleição de caractere não tão bem construídos assim. Ressignificada, o sentindo original de uma palavra pode cair por terra para sempre, funcionando apenas no seu segundo sentido. A exemplo, temos o poder dos símbolos perdidos, no caso dos brasileiros, o patriotismo pela bandeira pelos bolsonaristas.

Voltando a pensar sobre as palavras, remanejo os meus pensamentos. Outra vez a palavra guerra chega à ponta da língua. E me questiono: não é disso que se trata essa luta contra a pandemia?

Possui até um tom satírico pensar toda essa coisa em uma outra perspectiva. Em plano de fundo, os governos lutam pelas políticas egoístas, individualizadas, mas à vista de nossos olhos, a maior parte da população brasileira [&mundial] está lutando para construir uma saída rápida para esse problema que nos afeta a todos nós de uma só vez.

From website: giphy.gif

Eu sempre fui um jovem-adulto dos anos 90 que cresceu escutando, nas escolas, acerca da potência positiva da globalização. Ignorei o lado negativo até surgir o Covid-19, a ideia de que o mundo é de fato um grande dominó. Das grandes potências às pequenas. Ressalto o Covid aqui, porque em outras pandemias, como o H1N1, por exemplo, eu não era politizado o suficiente para entender a gravidade do acontecimento.

Talvez, por uma atitude egoísta, penso que a unificação dos seres humanos em primeiro plano seja pela vontade de voltarmos a caminhar de forma livre outra vez, isto é: quanto mais rápido solucionarmos isso, mais rápido poderemos ser livres outra vez.

Uma crença imposta para minha geração: restou para nossa geração o direito de ser livre, de (re)descobrir o mundo all colonizado e de se autorreferenciar nas mídias. E a falta disso afeta. Mas, também, não desacredito que essa luta seja por aprendizagem e compaixão aos nossos, ao mundo e de que as coisas podem melhorar. Volto a citar Joey Tribianni, que pode desvalidar toda o meu texto, mas que tem uma afirmativa bem sincera: “não existe uma boa ação que seja altruísta”

From TvShow Friends. Season 5, ep 4. “The One Where Phoebe Hates PBS”.

Voltando.
Acredito também que alguns de nós começamos a pensar o quanto precisávamos desacelerar e como tudo isso é uma grande dualidade, por que aposto que a sua leitura desse texto foi corrida porque tem alguma atividade do Home Office para fazer.

Entretanto, o que me vem a ser o cerne desse texto é a minha irmã. Ela é o exemplo de que esse “novo normal” ocorrem em um acontecimento em cadeia [igual o dominó, oh]. A empresa dela se tornou 100% homeoffice para o resto da vida, mesmo quando o isolamento passar, e com isso ela poderá passar mais tempo em casa, o que inclui a minha sobrinha, que passava tempo com ela só nos fins de semana, que são corridos também, em época normal. E para além disso penso que haverá menor consumo de itens que poluem. O transporte, o consumo fora de casa, o estresse, o que acarreta compra de medicamentos indevidos e afins e por aí vai.

Em particular, se eu tivesse que responder à pergunta, eu diria: que sobrou tempo para frearmos as coisas. Depois de vermos, ou termos lido nos livros a catastrófica história do século XX, acredito podemos nos conscientizar melhor, em meio a uma situação histórica, que podemos assumir que precisamos ir mais devagar, diminuir o consumo e a superprodução e, claro, que podemos evitar a repetição de alguns fatos históricos — ainda que no Brasil o caos político é grave e tratado pela ignorância.

Para além disso tudo, penso também que, em meio a pandemia, percebemos o quão é importante apoiar comércios locais e como a situação econômicas de microempresas podem funcionar melhor hoje, com a ajuda das mídias sociais. Outra questão que levanto, mas nunca trouxe à tona é, o que percebemos como serviço essencial ou não, porque há muitos trabalhos que foram redesenhados para serem feitos em casa, com o devido suporte, até mesmo a compra de supermercado online.

Em resumo, o que quero trazer é a reflexão sobre o que temos, sobre o que é resto ou que é novo e de como podemos ressignificar essas novas dualidades que o mundo nos oferece.

E você? O que você acha que restou para nós?

não sou bom fazendo networking, mas se vocês quiserem me seguir nas redes sociais, tem aqui o twitter e o instagram.

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Miguel A Silva

Master’s in literature studies from Federal University of Minas Gerais (UFMG) and Bachelor of Arts and Spanish Literature.